A economia comportamental revela como cada consumidor age diante de diversos estímulos e a importância do uso de modos diferentes de lidar com o consumo e com o dinheiro. Neste Dia Mundial do Consumidor, 15 de março, o professor de Direito da Universidade Federal do Paraná Rodrigo Luís Kanayama, estudioso da economia comportamental, defende que cada um deve ter preservada a liberdade na hora de escolher.
Ele explica que o ser humano pode utilizar dois sistemas diferentes quando faz escolhas. No primeiro, a pessoa acredita que já sabe o que é melhor, age de forma automática, sem precisar pensar, muitas vezes movida pela emoção.
“Esse comportamento automático acontece, por exemplo, quando dirigimos um carro. E esse mesmo sistema funciona quando fazemos uma compra por impulso, sem refletir sobre a quantidade que realmente necessitamos ou se realmente precisamos daquele produto ou serviço. Nós não pensamos, simplesmente fazemos”, diz. “É quando compramos algo sem precisar apenas porque está barato”, exemplifica.
O sistema 1, de acordo com os estudiosos da economia comportamental, é automático e funciona para muitas coisas, mas também pode levar as pessoas a cometer erros.
O segundo sistema, explica Kanayama, nos faz refletir antes de agir. “Isso dá mais trabalho, requer que pensemos mais antes de tomar decisões. Em geral, as pessoas tendem à inércia”, declara.
Um exemplo é quando o consumidor adia o cancelamento da assinatura de uma revista que não o interessa mais. “Muitas vezes, dá trabalho cancelar, leva tempo. Mas cancelando, a pessoa terá uma economia de dinheiro.”
Isso também vale para a mudança ou cancelamento da assinatura de TV a cabo, do plano do telefone celular. É preciso pensar antes para fazer a melhor escolha. “Enquanto continuamos inertes, o mercado cria armadilhas comportamentais.”
De olho na hora da compra
Kanayama defende que as pessoas podem comprar melhor se refletirem como se comportam no momento de fazer escolhas e ainda quando analisam a estrutura do preço daquilo que vão adquirir.
Ele cita como exemplo a compra de uma bebida que tenha opções diferentes de preço, conforme o tamanho do recipiente. Identificar o preço de cada produto por litro pode ajudar a tomar a melhor decisão, adequada à necessidade do consumidor e àquilo que a pessoa pretende ou pode pagar naquele momento.
O professor acredita que é possível ainda escolher empresas que ajudem o consumidor a fazer escolhas conscientes. Isso vale para os mercados que informam facilmente o preço por quilo ou por litro para que o consumidor escolha o produto mais adequado à necessidade. “Com as informações certas, as pessoas refletem mais e podem tomar as decisão que são melhores para cada um”, diz Kanayama.
Nobel de Economia
A economia comportamental ganhou notoriedade depois que Richard Thaler conquistou o Nobel de Economia em 2017. Thaler trouxe o conceito do nudge, palavra em inglês que, neste caso, significa empurrão. Trata-se da teoria do incentivo, que permite que as pessoas façam a sua opção com base nas informações que recebeu, mas preservando a sua liberdade de escolha.
Kanayama relata que a teoria de Thaler surgiu a partir da observação de seus alunos. Para sair da sala de aula, havia uma porta de empurrar, mas os estudantes a puxavam. “A porta tinha um puxador, o que leva as pessoas a usarem o recurso, em vez de empurrarem a porta”, contou.
Sistemas 1 e 2 da economia comportamental podem ajudar a poupar dinheiro
O professor Rodrigo Kanayama explica que, com base na economia comportamental, o mesmo jeito que as pessoas usam na hora de gastar também pode ser útil no momento de economizar dinheiro. Ele explica que uma das formas de poupar é utilizar algum modo que não exija pensar antes de fazer. Uma das maneiras seria programar o débito de algum valor para determinada aplicação ou para a aposentadoria complementar.
“Em uma poupança automática, por exemplo, o reflexivo não vai funcionar. De forma automática, o dinheiro é guardado”, cita.
O professor diz ainda que uma combinação dos dois sistemas pode ser um bom recurso. “É possível criar uma auto-restrição, ou seja, usarmos o sistema 2 para conter o sistema 1.”
De acordo com Kanayama, uma pessoa que queira emagrecer e deixa de ter em casa coisas que ela não deve comer para não engordar, está criando um sistema de auto-restrição. “Muitas vezes a pessoa come porque não para pra pensar”, diz.
Com base na auto-restrição, Kanayama sugere o uso de algum recurso que possa ajudar a controlar os gastos no dia a dia. Um deles é o sistema de envelopes, em que a pessoa estabelece valores fixos da sua renda para o pagamento de suas despesas, por assunto.
“Isso pode ser feito numa tabela no computador. O importante é que a pessoa reflita antes quanto vai reservar para cada envelope e siga ao longo do mês utilizando o dinheiro conforme o que foi estabelecido. Assim é possível evitar o uso do dinheiro no sistema 1”, ensina. Ele diz que essa organização dá trabalho, mas traz bons resultados.
Se o plano é fazer uma viagem, pode-se estabelecer uma cota que deverá ser guardada regularmente. “Para evitar que gaste com outra coisa, você tira da tua margem discricionária, evita que o sistema 1 funcione e poupa para não gastar”, ensina.
Palestras
Em fevereiro, Kanayama falou aos servidores da Prefeitura de Curitiba que fazem parte de mais uma turma do curso de pós-graduação em Administração Pública. O tema da aula magna foi Políticas Públicas: Liberdade ou Paternalismo.
O advogado e professor analisou com os servidores como é possível produzir políticas públicas eficientes, sem violar a liberdade dos cidadãos, utilizando os conceitos da economia comportamental para explorar aspectos do dia a dia do serviço público. “Pode-se preservar a liberdade, mas indicar o caminho mais eficiente”.
Abordagem semelhante foi feita por Kanayama e pelo professor Eduardo Pianovski há poucos dias, em Massachusetts, nos Estados Unidos, para alunos de graduação e da pós-graduação da Escola de Direito de Harvard.
A palestra Economia Comportamental e Liberdade foi feita a convite do ex-aluno da UFPR, hoje professor e pesquisador Felipe Frank, por meio da Associação Brasileira de Harvard. Kanayama fez uma análise a partir das redes sociais, mostrando a importância de se reduzir as notícias falsas (fake news). Também tratou do equilíbrio entre a liberdade de expressão e a demanda por regulação das redes sociais.