Passar o dia no banco para abrir uma conta, checar um extrato ou conversar com o gerente ainda é uma realidade para muitos brasileiros. Acontece que, desde 2013, essa rotina cansativa tem dado lugar a soluções muito mais tecnológicas. Tudo por conta das startups das chamadas Fintechs – como o Nubank, o Banco Inter e Original, por exemplo – que permitem que o cliente faça tudo digitalmente, pelo celular.
Apesar dessa tendência de digitalização das contas e processos, isso não significa que os bancos tradicionais estão perdendo mercado. Ou, pelo menos, essa é a avaliação do CEO do site Seu Crédito Digital, Eduardo Mendes.
Segundo o administrador de empresas, as pessoas ganharam mais opções para uma atividade bancária mais rápida. “Com o surgimento das Fintechs, os bancos tradicionais vêm investindo nas plataformas digitais”, explica Mendes.
Luiz Antonio Joia, professor da escola brasileira de administração pública e de empresas da FGV, também acredita que os bancos tradicionais não vão desaparecer. O professor lembra que ainda existe toda uma geração que prefere o contato com o gerente e anseia por um atendimento individualizado e de confiança.
De acordo com uma pesquisa realizada pela consultoria Cantarino Brasileiro em fevereiro deste ano, 15% dos entrevistados que usam os bancos tradicionais, também possuem contas nas Fintechs.
“A gente dizer que os bancos tradicionais vão acabar não é verdade. Mas algo importante é a imigração de uma enorme quantidade de clientes para os bancos digitais, onde tem custo mais baixo e mais rapidez”, pontua o professor da FGV.
Alvaro Taiar Junior é o responsável pela Indústria de Mercado Financeiro da PwC e considera que os bancos tradicionais não podem “perder” para as Fintechs. O especialista acredita que um investimento mais próximo ao cliente pode ser vantajoso tanto para o Banco quanto para o próprio usuário do serviço. “A partir do momento em que os bancos tradicionais conseguem reunir mais clientes através da sua plataforma digital, também cai o custo e eles conseguem passar uma rendição de custo para o cliente final também”, avalia Junior.
Perfil do Cliente
O levantamento da Cantarino também mostra qual é o perfil do usuário que opta por contratar uma Fintech. De acordo com a pesquisa, 48% dos entrevistados que escolhem a plataforma digital têm até 29 anos, sendo que apenas 27% deles são usuários dos bancos tradicionais.
Luiz Antonio Joia explica que é natural que uma geração que nasce cada vez mais em ambientes com tecnologia, internet e redes sociais, seja o foco dessas Fintechs. De acordo com o especialista, essas pessoas “foram criadas e têm estilos de vida em que não querem ir a bancos e nem conversar com gerentes”.
Mas não é apenas de jovens que se sustenta uma Fintech. De acordo com o levantamento da Cantarino, 7% dos entrevistados com mais de 50 anos usam Fintechs forma exclusiva. Além disso, quando bate a dúvida sobre qual conta possuir, 32% das pessoas de 30 a 49 anos mantêm as duas contas: a tradicional e a das Fintechs.
É o caso de Alberto Francisco, de 47 anos, servidor público e que optou há mais de um ano por abrir uma conta em um banco digital por questão de facilidade e, também, por não ter tempo de comparecer fisicamente ao banco. Francisco explica que só mantém a conta aberta no banco tradicional, porque é por lá que recebe sua conta salário. “Só por causa disso que ainda tenho a conta, se não já tinha desvinculado e ficava só com o digital. Ele veio para modernizar o país, é bem-vindo e eu tenho um controle maior”.
Acontece que essa dúvida sobre fazer a migração total para um banco online ou permanecer em um tradicional não é só dos mais velhos. Mariana Marques, que é digital influencer, tem 23 anos e começou há pouco tempo a usar um banco online por indicação de amigos. Ela conta que foi atraída pela anuidade zero, além de zero taxas de transferência cobradas. Marina lembra que ainda mantém sua conta no banco tradicional porque, na hora de sacar dinheiro, os bancos digitais ainda cobram uma taxa. “Por enquanto estou dividindo para ver qual vou manter, estou deixando um pouco de dinheiro em cada [conta] para ver como vai ser o rendimento”. Mariana ilustra bem um exemplo de jovens que mantém as duas contas. Na pesquisa da Cantarino, 27% dos jovens até 29 anos possuem conta em ambos os formatos.
Alvaro Taiar Junior, responsável pela indústria de mercado financeiro na PwC, lembra que o público mais jovem é o mais atraído pelas Fintechs. “Esse pessoal muitas vezes tem menos recursos financeiros, então acaba não sendo um cliente interessante para uma estrutura cara, de uma estrutura clássica, com um gerente, com sala, cafezinho. Ele encontrando o melhor dos dois mundos porque a pessoa está mais apta a fazer pelo mundo digital e as Fintechs com os custos mais baixos estão mais palatáveis para oferecer um serviço, até de graça, ou mais barato, para aquele jovem”, considera Junior.
Perfil das Fintechs
Segundo pesquisa divulgada ano passado pela PwC e ABFIN TECHS, das 224 Fintechs analisadas, 94% estão nas regiões Sul e Sudeste do Brasil. A pesquisa também apresenta que 47% das pessoas à frente das Fintechs têm entre 30 e 39 anos.
Outro ponto da criação da Fintechs é que elas surgem apenas exercendo um pedaço da função de um banco, e não necessariamente atuam como um banco múltiplo, como relata Alvaro Taiar Junior “Muita delas preferem ser especializadas em uma área. As áreas que mais concentram é de payaments, meio de pagamento. Outro grupo de Fintechs fortes são de créditos, que têm um custo de emprestar mais baixo. Nesses casos, tudo é digital, inclusive a papelada, aí acaba diminuindo os juros”, ressalta Alvaro.
Na pesquisa da PwC, 25% das Fintechs analisadas possuem o segmento de meio de pagamento e 21% têm a linha de trabalhar com créditos, financiamentos e negociação de dívidas.
No ponto de vista de Luiz Antonio Joia, professor da escola brasileira de administração pública e de empresas da FGV, essas Fintechs começam focadas, no âmbito de conta, crédito e finanças, mas tendem a crescer. “A tendência é que as Fintechs acabem oferecendo todos os serviços que os bancos tradicionais oferecem. Não há por que não oferecer”, pontua.
Luiz Antonio Joia reitera que essa tendência de aderência às Fintechs faz parte de uma Transformação Digital. Segundo ele, isso acontece tanto no setor privado, quanto no público. “Por exemplo, nós temos um presidente que foi eleito no Brasil com sete segundos de tempo de televisão e gastou 10 milhões de reais, o que não é nada, porque na verdade ele usou o mundo digital. Então o que está acontecendo no mundo é a transformação digital e o setor financeiro é usado por todos porque ninguém vive sem dinheiro. E aí vêm as Fintechs como a transformação digital das finanças.”
Apesar de todas as facilidades oferecidas por essas empresas, Joia lembra que existem pessoas que nem têm acesso à internet no Brasil. Por isso mesmo, o especialista faz uma reflexão, em que pensa sobre as possíveis exclusões que esses Bancos podem ofertar, mesmo que indiretamente. “Pessoas que mal sabem usar o banco tradicional, como vão usar o QR CODE, o token? Existem desafios que vamos ter que encarar daqui a pouco”, analisa o especialista.